O Brasil é um país, digamos, sui generis.
Em 2024, a Câmara dos Deputados aprovou 338 projetos de lei – produtividade notável. Entre temas de alta relevância, como a Reforma Tributária, também surgiram matérias, digamos, mais… peculiares.
Este texto não pretende discutir o mérito da produção legislativa nacional (até porque não me cabe tal legitimidade democrática), mas propor uma comparação curiosa.
Entre tantas normas aprovadas — quase uma por dia — o ano de 2024 trouxe ao ordenamento jurídico brasileiro a Lei nº 14.940/2024, que institui o Dia Nacional do Funk.
O projeto, vale registrar, não surgiu de improviso. Foi proposto em 2021 e tramitou por 1.057 dias na Câmara dos Deputados, até ser aprovado em maio de 2024 e posteriormente sancionado. A justificativa citava manifestações da imprensa e até o site KondZilla (juro, é verdade).
Controverso ou não, o fato é que essa lei não impõe nada a ninguém.
Ela homenageia um movimento cultural, mas preserva a liberdade individual: quem quiser ouvir, ouça; quem preferir um bom R&B em noites chuvosas, siga em paz.
É, portanto, uma lei que amplia o repertório cultural sem restringir a escolha.
Pois bem, vejamos um caso recente e em paralelo.
O PL 5.041/2025 que trata de transporte gratuito de bagagens e outras providências foi iniciado em 08/10/2025. Em uma tramitação ultra expedita, para não dizer meteórica, foi aprovado em Plenário no dia 28/10. Em incríveis 20 dias!
Durante este período, várias instituições públicas e privadas, nacionais e internacionais, alertaram para os riscos e a necessidade de discussão aprofundada e franca deste tema, sensível e polêmico por definição. KondZilla teve mais sucesso na instrução.
E para além da tramitação, há algo maior em jogo: a liberdade de escolher.
A grande ironia reside na comparação: a Lei do funk, em sua essência, amplia horizontes culturais sem forçar a barra. Você tem a opção de abraçá-la ou de ignorá-la. Já o PL das bagagens, em sua aparente intenção de “beneficiar o consumidor”, retira a opção. Ele elimina a escolha daquele que, talvez por viajar apenas com uma bagagem de mão, preferiria pagar menos pela passagem, sem o custo “embutido” de um despacho que não usará. É a diferença entre ter mais uma opção de ritmo na playlist e ter uma opção a menos no check-in, sendo obrigado a subsidiar a bagagem de quem realmente precisa despachar.
Precisamos discutir com racionalidade e consequencialismo o que está em jogo.
Afinal, se o PL das bagagens prosperar e se consolidar como lei, preparem-se: o consumidor, gostando ou não da batida, é quem vai “dançar” no final dessa festa legislativa.
E, sinceramente, a coreografia que se desenha parece bem menos divertida e, certamente, mais cara.
Fonte: acesse o link.
